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segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Sentir o Tarrafal





Parte-se em busca do tal paraíso. O Tarrafal... vila ligada ao mar, às lendas de outras épocas. A presença do monte, dos espelhos de água, guardados pelas montanhas... imunes ao sussurro do tempo que viaja em câmara lenta.




Parte-se com o anseio de descobrir os pedaços da história espalhados pelo Campo de Concentração em Tchom Bom, um património histórico que impressiona pelas vivências drámaticas. que as paredes fazem questão de guardar...


Parte-se para encontrar os sentimentos perdidos de uma terra que criou os “Rabelados da Ilha de Santiago”. Entender o que sentiu em tempos passados. Olhar para os momentos presentes: de um Tarrafal em que as potencialidades turísticas anseiam por um desenvolvimento há muito esperado.



Embarca-se numa viagem com cerca de duas horas, onde imagens dignas de um cartão de postal não combinam com o caminho que se tem de percorrer. Muitas curvas, subidas, descidas e uma estrada em alcatrão que começa na Praia e termina na cidade da Assomada.

A partir daí, o resto do troço fica à mercê de sobressaltos, próprios de uma caminho inacabado. Hiaces, jipes, carros, que transportam aqueles que querem conhecer ou reconhecer o tal paraíso, não têm a vida facilitada neste percurso.
Hiacistas, turistas, habitantes locais, todos querem o mesmo: Uma estrada em boas condições até ao paraíso.

A Vila, um diamante por lapidar. Cada grão de areia branca espalhado pelas praias paradisíacas carrega as pisadas de pescadores e peixeiras que pedem ao mar o seu sustento.

Uma baía rodeada de coqueiros, na Praia do Mangue, serve de cenário para as brincadeiras dos mais novos, onde o mar e o futebol se conjugam num só.


A tradição já não é o que era. Os mais de 200 pescadores da Vila, usam a sobrevivência como palavra de ordem. À rotina exaustiva e arriscada junta-se um regresso das águas, incógnito a cada dia que passa. As culpas dividem-se entre a falta de investimento e uma política de gestão inexistente.




O porto que no antigamente serviu de abrigo a muitos iates vindos de terras europeias, actualmente, apenas recebe os homens do mar e alguns habitantes locais.

O abandono é visivel e a epoca aúrea de outros períodos, foi levada pela brisa. Apenas ficou o porto e os tarrafalenses. Quanto aos barcos de outras paragens, esses podem ser vistos ao longe, pelo buraco do tempo.




A mudança espera-se a cada segundo vivido no alto mar. A esperança está retratada nos rostos, nas expressões calorosas que recebem de braços abertos os escassos turistas que vão aparecendo.
O seu objectivo na Vila é diferente. Procuram um pedaço de céu na terra, a sua própia pausa e descanso: calmo, sossegado com as águas cristalinas e mornas como banda sonora que convida a horas perdidas de mergulho.

Mas não é só do mar que vive o Tarrafal. Os cerca de 22 mil habitantes dividem-se entre a agricultura, o artesanato, a restauração, o comércio... E as unidades hoteleiras... Poucas mas sobreviventes a um período em que as reservas de quartos são mínimas.





O aldeamento Turístico Baía Verde, situado estrategicamente num dos extremos da praia , não é excepção. Os 34 Bungalows que dão vida ao espaço têm acolhido poucos visitantes nos últimos tempos.

A acompanhar a crise estão os aumentos dos roubos na zona e aos poucos a perda do mercado, holandês, alemão e francês. O sentimento é geral: o Tarrafal necessita de uma cara nova. As opiniões dividem-se: fala-se de assaltos, insegurança a aumentar, comenta-se as crispações políticas entre a Câmara (MPD e o Governo (PAICV) opina-se sobre investimentos estrangeiros que nunca se realizaram. E a espera continua à espreita.

Investir. Foi o que levou o dono do Baía Verde, Manuel Gonçalves a sair de Portugal e regressar às ilhas crioulas. Apesar do hotel sobreviver à custa do turismo internacional, o responsável tem fé num futuro risonho... apesar de não ser para já. Crê que o investimento só começará a dar frutos daqui a 3 anos, entretanto avizinha um 2009 negro.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. O Hotel Tarrafal, um dos mais antigos da zona, com 20 quartos disponíveis, também não foge à mão pesada da crise. Face aos problemas que tem atravessado, a unidade hoteleira prepara-se agora para enfrentar um novo desafio. O trunfo lançado pelas mãos de investidores europeus será reconstruir por completo o edíficio, dando lugar a um pequeno resort de luxo.

Espera-se nos bancos de jardim da praça central pelo tão ansioso investimento. Olha-se para os ponteiros do relógio e aguarda-se por mais meios policiais. São cerca de 14 os efectivos da esquadra, mas apenas quatro estão disponíveis para as patrulhas diárias, que se fazem em turnos de 24 horas. O cansaço. A inércia.


Anseia-se pela chegada de um aeroporto, de uma marina por algo que traga prosperidade. Enquanto as promessas não se cumprem, os tarrafalenses vão dando azo à imaginação e tentam através da própria criatividade, cativar os estrangeiros. Gastronomia apetitosa, uma simpatia genuína e irresistivel, uma hospitalidade que enquadra-se na perfeição com o ambiente paisagístico.

O Mercado Municipal. Uma das obras com maior utilidade para os Tarrafalenses. O local enche-se de gente misturada com o barulho do regatear de preços ou dos pregões crioulos das vendedoras... O cenário deveria ser esse.

A infra-estrutura que custou cerca de 14 mil contos e comporta cerca de 3500 comerciantes, não escapa aos efeitos da crise e às queixas de quem olha para ele como modo de vida, modo de ser, modo de estar.

Conotado como um dos municípios mais pobres da Ilha da Santiago, sem um hospital que preencha as necessidades de quem lá vive e de quem o visita, tendo apenas um posto de Saúde com condições rudimentares, o Tarrafal assume-se como uma pérola à espera dos tais holofotes que iluminem o seu caminho.



Enquanto isso, um dos postais turísticos da terra de Morabeza mantém-se fiel a si mesmo. Com as praias, as montanhas, a pesca, as águas de coco, a baía, e a música como pano de fundo. Sempre à espera do tal desenvolvimento...


A Não perder: Quinta-feira, dia 12, Nha Terra Nha Cretcheu, programa dedicado ao Tarrafal. 20h30 Cabo Verde, 21h30 Portugal.



2 comentários:

Anónimo disse...

Olá!

Estive lá de férias no verão passado, 12 anos após a última visita, e foi um choque ver que nada mudou esse tempo todo!

Tarrafal parou no tempo.

Margarida Conde disse...

Olá Amilcar:

Sabes o Tarrafal é o meu sítio de eleição em Cabo Verde, sei que vou encontrar pelas ilhas talvez lugares mais exóticos e bonitos, mas aquele cantinho na Ilha de Santiago, tem um efeito em mim que não sei explicar.

Por isso quando estive a fazer a reportagem entristeceu me ver um lugar com tantas potencialidades e tão mal aproveitado.

E depois não há consenso. A Câmara diz que é o Governo que não ajuda por esta ser do MPD e o Governo diz que a autarquia está de costas voltadas e que não quer colaborar.

E nos entretantos quem paga são os tarrafalenses que vão esperando, sentandos nos bancos do jardim da praça, pelo tal desenvolvimento que lhes poderá melhorar a vida.

Os turistas que passam por lá um ou dois dias e nunca mais querem voltar pela falta de condições ou o próprio lugar que cada vez está mais ao abandono.

Um paraíso disfarçado...